quinta-feira, 23 de abril de 2015

O que NÃO é plágio? - entrevista concedida ao blog "Foi Plágio" pelo Prof. Dr. Marcelo Krokoscz


1. O senhor já ministrou cursos sobre integridade acadêmica e mantém um blog sobre plágio. Gostaria que o senhor falasse sobre procedimentos que NÃO são plágio e, se possível, desse exemplos.

Por mais incrível que pareça é muito difícil cometer plágio. É que o estilo de escrita pessoal e a riqueza linguística conferem a cada pessoa uma “impressão autoral” exclusiva. Portanto, quando se escreve espontaneamente, é impossível reproduzir literalmente outra pessoa. Claro que pode acontecer uma repetição de ideias, mas isto é aceitável quando se refere a assuntos de conhecimento comum. Neste sentido, qualquer pessoa pode escrever, por exemplo, sobre “riscos de investimento”, “bons hábitos de alimentação” ou sobre “as ideias liberais”. Também não ocorre plágio quando cada pessoa escreve o seu ponto de vista sobre um acontecimento histórico ou um fato da realidade. É o que acontece, por exemplo, com o ofício do jornalismo, por meio do qual são produzidos textos em torno de uma mesma ideia ou acontecimento, mas com uma individualidade autoral. Também não se considera plágio a adoção textual de expressões que estão em domínio público, caso dos ditados populares. Finalmente, não se considera plágio quando se faz uma paródia. Neste caso, o autor e a obra original embora possam não estar claramente identificados, são reconhecidos pelo público leitor e isto inclusive é uma condição necessária para a interpretação adequada da paródia.


2. Quais são os cuidados que professoras e professores devem ter ao verificar as informações contidas nos trabalhos acadêmicos, a fim de não acusar, injustamente, estudantes de cometerem plágio ou outras práticas antiéticas na escrita acadêmica?

Defendo a opinião de que o ponto de partida para o enfrentamento do plágio é a conscientização de que se trata de um problema complexo que diz respeito a diversos personagens: o autor, o reprodutor, o leitor, a instituição e a sociedade. Portanto, pode ser uma medida simplista adotar a medida de culpabilização se não existe um trabalho preventivo de esclarecimento e orientação. Da mesma forma, é necessário que seja convencionado o que é plágio, quais são os tipos, como ocorre e quais são as sanções previstas no caso da ocorrência.
Neste sentido, pode ser um equívoco partir do princípio de que cópia é plágio. Em outros casos, não existe cópia, mas ocorre plágio! Garantir que todos tenham clareza sobre aspectos como este é um bom começo para não se acusar e condenar injustamente.


3. Quais são as medidas, legais e/ou acadêmicas, cabíveis por parte da pessoa acusada injustamente?

O parâmetro legal neste caso é a Lei de Direitos Autorais a ser interpretada de acordo com as especificidades de cada caso.  Academicamente, é preciso ver qual é a convenção adotada institucionalmente sobre o assunto. Consta do Código de Ética? Está prevista no Manual do Aluno? Há informações e orientações sobre o assunto nos portais eletrônicos institucionais? A partir daí se poderá embasar ou não as argumentações.
Cabe observar ainda que nem sempre no âmbito acadêmico um caso de fraude autoral é um problema legal. Por exemplo, é o que acontece com os trabalhos acadêmicos comprados. Neste caso, o estudante paga pelos direitos autorais não ficando aí nenhum problema legal e pode considerar-se até injustamente acusado por algo que não cometeu. Até se pode caracterizar o caso como falsidade ideológica, mas academicamente o problema maior é a fraude autoral, ou seja, o fato da instituição receber um trabalho acreditando que se trata da expressão da competência intelectual do estudante que o está apresentando. Neste caso, o problema não está no fato de que alguém que produziu um trabalho foi prejudicado, mas sim a instituição que o está recebendo.


Agradeço sua participação. As informações contidas na entrevista serão publicadas, na íntegra, no blog “Foi Plágio”. Por isso, gostaria que o senhor esclarecesse se permite ou não sua identificação. Em caso afirmativo, será publicado seu nome completo. Caso haja outros dados que o senhor queira publicados (dados acadêmicos ou links para sua página pessoal), por favor, escreva abaixo. Obrigada mais uma vez.

Créditos: Renato de Souza
Marcelo Krokoscz é Doutor em Educação (FEUSP); Mestre em Educação (FEUSP); Licenciado em Filosofia (UNIFAI), Bacharel em Teologia (UNIFAI); Licenciado em Pedagogia (UNIBAN); Membro da rede acadêmica mundial para o enfrentamento do plágio (PlagiarismAdvice.org); Autor dos livros "Autoria e Plágio: um guia para estudantes, professores, pesquisadores e editores" (Atlas, 2012) e “Outras palavras sobre autoria e plágio” (Atlas, 2015); Editor do website www.plagio.net.br; Editor da revista Liceu Online. No meio acadêmico desenvolve pesquisas e apresenta conferências sobre autoria, interesse, originalidade e plágio no processo de produção, redação e publicação científica. No ensino superior é professor assistente de Metodologia Científica e Coordenador do Programa de Iniciação Científica na Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (FECAP); Na Educação Básica é diretor do Colégio FECAP. No meio editorial realizou trabalhos de consultoria técnica para a publicação de obras didáticas da Editora Moderna e da Editora Ática. Contato: marcelix@usp.br